Reflexões acerca do artigo do Professor José Otávio Auler
Junior, publicado no jornal Folha de São Paulo, na coluna “Tendências e Debates”
no dia 18 de fevereiro de 2013.
Por uma educação de
qualidade para todos, sem discriminações e elitismos
Flávio Boleiz Júnior
Somente ontem de
noite li o artigo do professor da USP, Dr. José Otávio Costa Auler Junior.
Gostaria de contrapor alguns argumentos apresentados
por ele que, ao meu ver, se encontra absolutamente equivocado quanto à questão das
cotas nas universidades paulistas.
Logo no primeiro parágrafo, o autor sugere que nossa
nação "pretende se inserir num mundo globalizado e competitivo".
Entretanto essa não é uma pretensão de nossa nação, mas dos empresários e
capitalistas em geral que desejam encontrar meios de multiplicar seus lucros e
acumular mais capital por meio da exploração do trabalho de nossos concidadãos
e dos bens naturais ainda abundantes em terras brasileiras. A pretensão de
nossa nação é formar uma cidadania solidária, e não competitiva, plena de
diversidade, e não globalizada, apoiada nos valores dos direitos humanos, da
pluralidade de pensamentos e na liberdade de escolhas e de expressão. Uma
sociedade cuja cidadania se possa exercer a partir da igualdade de direitos,
sem dúvida nenhuma, mas também de condições e oportunidades.
No segundo
parágrafo, o autor atribui diferentes “vocações” às diferentes universidades e
às unidades que às compõem. Metáfora pobre para tentar explicar o
desnivelamento da qualidade presente no mundo acadêmico entre as instituições
que lhe dão forma. Esse desnivelamento não advém de vocações diferentes, mas do
tratamento absolutamente desigual que é aplicado à regulamentação,
regularização e fiscalização das instituições de Ensino Superior por parte do
Ministério da Educação, sem falar na obscenidade que constitui a existência das
instituições privadas que, com raríssimas exceções, comercializam uma péssima
formação para a maioria dos jovens brasileiros que, advindos das classes
populares, não conseguem quebrar a barreira elitista dos vestibulares das
instituições públicas.
Em outro ponto de
sua argumentação, o autor fala em “universidades de classe mundial”. A
utilização dessa expressão bem pode ludibriar o senso comum, levando a crer
que, no mundo, o padrão das universidades é elevado e muito desenvolvido
enquanto que em São Paulo o nível das universidades em geral está aquém dessa “classe
mundial”. Entretanto a realidade apresenta, no mundo todo, um seleto grupo de
universidades, indisponível à maioria das pessoas, com altíssimo nível de
qualidade. Trata-se de instituições financiadas pela iniciativa privada, quer
dizer, pelo capitalismo internacional que paga pelas pesquisas que combinam com
seus interesses no sentido de se produzir mais e gerar melhores lucros e
condições de acúmulo de capital.
Mais adiante o
artigo faz menção à necessidade de um corpo docente altamente qualificado, a
que chama “um corpo docente apto”, como condição para garantia da organização
de instituições de excelência. A julgar pela argumentação anterior, somente os
profissionais formados por instituições “diferenciadas” — como USP, Unesp,
Unicamp, Ita... — poderiam compor um tal grupo seleto de professores. Essa
assertiva não deixa de estar correta, mas não por conta de qualquer tipo de
vocação ou inclinação “natural” das instituições citadas, e sim por causa do
tratamento diferenciado que essas universidades recebem por parte da gestão
pública, que privilegia as instituições que se destinam a atender as classes mais
abastadas da nossa sociedade.
Com influência
quase religiosa em sua argumentação, o Professor Costa Auler Junior fala da
necessidade de talento, tanto do
corpo docente quanto do discente para que se possa caracterizar uma
universidade de qualidade. Entretanto o que se necessita é de eficiência e
eficácia na formação da classe docente e no tratamento do corpo discente para
que a qualidade se apresente e assente sobre os trabalhos universitários.
Defender uma
posição contrária às políticas de cotas com os argumentos apresentados pelo
Professor José Otávio Costa Auler Junior é assumir uma postura discriminatória
e preconceituosa pra com os estudantes oriundos das classes populares cuja
formação se realiza exclusivamente na rede pública de educação não por opção,
por vocação ou por talento, mas por determinação social. A luta democrática dos
professores universitários deve ser por uma educação da melhor qualidade para
todos desde a Educação Infantil até a pós-graduação, em instituições públicas e
bem administradas de acordo com os interesses da cidadania, e não do capital.
Tomemos cuidado
com o canto da sereia. Ele parece bonito e encantador!
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