terça-feira, 30 de outubro de 2012

Estado laico e Educação laica

Olá pessoal!

     Hoje (30/10/2012) li, com tristeza, uma notícia no mínimo ridícula acerca da Câmara Municipal de Piracicaba — interior do estado de São Paulo. De acordo com o sítio oficial da própria casa legislativa de “Pira” (modo carinhoso com que os nativos se referem à cidade), um cidadão foi colocado para fora do salão do plenário por se recusar a ficar de pé “durante a leitura de um trecho da bíblia”. Veja a notícia em http://www.camarapiracicaba.sp.gov.br/camara07/index1.asp?id=13856
     Como é que uma casa legislativa de um país constitucionalmente laico permite que algo assim aconteça?
     Fiquei indignado e resolvi enviar um e-mail de protesto a todos os vereadores de Piracicaba. Nenhum respondeu, mas fiquei feliz em ter tomado essa atitude.
     Refletindo acerca do ocorrido, me recordei de uma mensagem que veiculei na lista de Educadores da Rede de Educadores da Pedagogia Freinet – Repef, numa ocasião em que discutíamos a laicidade. Tomo a liberdade de publicar em seguida a mensagem, de modo que, neste espaço virtual, possamos prosseguir com a discussão desse assunto que, infelizmente, ainda é tão vivo em nossas escolas.
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Olá pessoal,

     Estive refletindo bastante e gostaria de me posicionar acerca do significado do ensino laico, que é uma das pedras fundamentais da Pedagogia da Escola Moderna.
     A laicidade não é sinônimo de ateísmo.
     Um praticante de religião que não se envolva com proselitismo (defesa de princípios de uma determinada religião) ou com procedimentos embasados em sua fé ou na moral de sua religião, estará agindo de maneira laica.
     Diferente do ecumenismo, a laicidade significa uma opção por não comungar de nenhuma fé, nenhuma religião ou expressão de religiosidade, nenhum tipo de superstição ou tabu, como forma de integrar todos os que tenham ou não tenham fé, confessem ou não alguma religião, acreditem ou na sorte e nos tabus.
     A Pedagogia da Escola Moderna (assim como a de nossa escola pública brasileira) se fundamenta num caráter laico. Para nós, brasileiros, isso não deve significar problema, uma vez que em nosso país, por princípio legal, a educação é laica, a não ser em casos específicos de escolas confessionais — que de qualquer maneira devem respeitar o livre pensamento de seus alunos.
     Ser cristão, espírita, budista, muçulmano, hindu, praticante do Candomblé, da Umbanda ou de qualquer outro tipo de religião não impossibilita, absolutamente, ninguém de praticar a Pedagogia da Escola Moderna (nem de ser um educador laico), desde que se conserve o compromisso de manter um ensino laico. Para tanto, basta que cada um se governe por condutas coerentes: não tem cabimento alguém se posicionar como "professor laico" e admitir que haja um crucifixo pendurado na parede da sala de aula... Muito menos admitir preces e orações durante o exercício de sua profissão docente!

     Eu, de minha parte, quando de minha participação em listas de e-mails ou de encontros educacionais, não trato a nenhum religioso por seu título eclesiástico. Um professor que seja um padre católico ou anglicano, numa reunião de educadores da Escola Moderna (ou de professores das escolas públicas) é somente um professor. Padre ele será lá na igreja dele. Uma freira ou um pastor, ou ainda um babalorixá ou um rabino, o serão em seus lugares de culto. Numa reunião de educadores, são meros merecedores do título de professor — se é que exercem a função de professores.
     Numa reunião de educadores da Escola Moderna (e da escola pública em geral), religiosamente falando, somos todos absolutamente iguais: laicos e unidos pelos princípios da cooperação e da educação popular.
     Se alguém discorda de minha posição, estou aberto a dialogar e, quiçá, mudar! Mas me parece não haver equívoco quanto ao que escrevi sobre ensino laico.
     Para quem quiser compreender um pouco melhor a importância da laicidade na Pedagogia da Escola Moderna, sugiro que leia o livro da Anne-Marie*, que trata muito bem do assunto, apresentando as motivações históricas  desse princípio!
     Abraços a todos!
Flávio Boleiz Júnior
*OLIVEIRA, Anne Marie Milon. Célestin Freinet: Raízes sociais e políticas de uma proposta pedagógica. Rio de Janeiro: Papéis e Cópias da Escola de Professores, 1995.

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